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COREOGRAFIAS DO IMPOSSÍVEL: DANÇANDO PELA 35ª BIENAL DE SÃO PAULO Por Coletivo Carambola

Em 7 de setembro de 2023, a Bienal de São Paulo abriu suas portas para a 35ª edição sob o intrigante título "Coreografias do Impossível". O evento, reconhecido por posicionar o Brasil no cenário global das artes, trouxe uma abordagem inovadora com um corpo curatorial horizontal integrado por Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel. Essa seleção de curadores não apenas reflete uma gestão horizontal, mas também destaca a importância de vozes dissidentes no cenário artístico.

O título "Coreografias do Impossível" sugere uma dança entre movimentos e desafios, onde a arte se propõe a desenhar sequências além das fronteiras temporais e espaciais convencionais. Este título, discutido por Diane Lima na primeira fala coletiva sobre a exposição, revela um profundo significado que transcende a mera junção de palavras. A expressão, segundo Lima, refere-se a práticas que constroem um espaço e tempo de percepção desafiadores da rigidez e linearidade do tempo ocidental. Essas coreografias, representadas pelo conjunto de obras presentes na exposição, desempenham dois movimentos centrais. Em primeiro lugar, elas desafiam, resistem e recusam os sistemas globais de violência, que moldam nosso imaginário social e estabelecem limites às noções do possível e do impossível. Aqui, as obras se tornam agentes de contestação, questionando ativamente as estruturas que perpetuam a opressão e redefinindo os limites do que é considerado realizável.

Em uma segunda instância, as coreografias do impossível especulam e antecipam o que pode vir a ser, criando uma ruptura no tempo. Essa natureza enigmática do fazer artístico se materializa ao imaginar mundos alternativos e, ao mesmo tempo, acelerar o fim de um mundo onde conceitos fundamentais como liberdade, justiça e igualdade são considerados impossíveis de serem plenamente realizados.

Assim, as coreografias do impossível não são apenas expressões artísticas, mas estratégias e políticas do movimento. Elas representam um conjunto de práticas artísticas e sociais que não apenas buscam imaginar novas realidades, mas também trabalham ativamente para acelerar mudanças, desafiando as limitações impostas por um mundo muitas vezes marcado por injustiças sistêmicas. Em última análise, esse conceito desafia o espectador a questionar não apenas o que é visualizado nas obras, mas também a refletir sobre as complexas interconexões entre arte, sociedade e possibilidades futuras.

A mostra conta com o trabalho de mais de 150 artistas nacionais e internacionais que produzem/circulam majoritariamente por territórios do Sul Global. Entre trabalhos de vídeo arte, fotografia, pintura, instalação, escultura e mais, o corpo curatorial teve como escolha a articulação de obras que agenciam debates políticos e estético-conceituais que questionam as dinâmicas vigentes de poder que vigoram no sistema-mundo contemporâneo. Gênero, raça, sexualidade, colonialidade, saúde, cuidado, meio-ambiente são parte do vocabulário que pulsa nos três pavimentos da trigésima quinta. Nomes como Rosana Paulino, Denilson Baniwa, Luana Vitra, Emanoel Araújo, Arquivo de la Memória Trans, Ventura Profana, Ahlam Shibli, George Herriman, Philip Rizk, Rubem Valentim, Sonia Gomes, Katherine Dunham, Cozinha Ocupação 9 de Julho (MST) e muito mais, estão presentes nesta edição.

Além da atuação de Diane Lima, Grada Kilomba, Hélio Menezes e Manuel Borja-Villel, “Coreografias do Impossível” contou com o diálogo e a assistência de curadoria de Sylvia Monasterios e Tarcisio Almeida, com um conselho curatorial formado por Omar Berrada, Sandra Benites, Sol Henaro e Thomas Lax. Ao longo dos dois anos de trabalho de pesquisa e montagem, a Bienal desenvolveu uma rede de residências artísticas em parceria com espaços/ projetos independentes como New Local Space (Kingston, Jamaica), Sertão Negro (Goiânia, Brasil) e Ëntun Fey Azkin (Wallmapu, Território Ancestral Mapuche). A edição teve o projeto de arquitetura e expografia desenhada pelo escritório paulista Vão, formado por Anna Juni, Enk te Winkel e Gustavo Delonero. Já a identidade visual foi pensada e desenhada pela artista visual, pesquisadora e professora Nontsikelelo Mutit.

A proposta conceitual da trigésima quinta acontece não só no plano das ideias, ela se dá através da articulação dos espaços projetados em relação às obras e na interação do público com os mesmos, O Vão, citado acima, define a arquitetura projetada para mostra como uma dança, como um espaço que desperta coreografias de percurso. A expografia, então, instaura uma inversão dos pavimentos e se cria uma ideia de contraponto, uma mudança de fluxos. Observando o modo como as obras são apresentadas pode-se perceber uma intenção de ritmo que em pausar, acelerar, criar velocidades e ritmos diferentes. Um formato descompassado, desconectado de uma esperada ordem ocidental. Embaralhar artisticamente e criar um trajeto que pode ser inédito para cada visitante, também reforça o trabalho formativo da equipe de educação da Fundação Bienal.

A relação entre tempo e espaço, e as obras e as pessoas por elas circulam, fazem parte de uma construção individual e coletiva que ilumina trocas, compartilhamentos e fortalece a fomentação de ações sociais e culturais. Se em sua essência a curadoria desta Bienal busca essa horizontalidade desde suas primeiras propostas, essas relações com o que acontece fora do pavilhão da Bienal também são muito importantes na questão de territorialidade. Em seu texto no catálogo da 35 Bienal: coreografias do impossível, encruzilhadas do tempo de Hélio Menezes, ele cita Saiydia Hartman.

A coreografia é uma arte, uma prática de se movimentar mesmo quando não havia outro lugar para ir, nenhum lugar para fugir. Era um arranjo do corpo que escapava à captura, um esforço para o inabitável habitável ( HARTMAN, p. 315).

A Bienal de 2023 acontece em meio a inúmeras tensões que nos aproximam, em meio a crises mundiais: humanas, climáticas, sociais, de saúde que nos incitam a pensarmos no futuro. A partir dessa mesma Bienal podemos perceber que a história que trazemos conosco é carregada de violências e que muitas novas histórias estão sendo contadas, recontadas, desvendadas. Provocados pelos curadores, pelas obras escolhidas e pela equipe de educação da Fundação Bienal, podemos perceber que é "urgente" entendermos que não sabemos nada, para então começarmos a construir um novo caminho, respeitando singularidades, diferenças e ouvindo todas as vozes individualmente e as vozes dos coletivos. A intenção é que possamos nos permitir a experimentar um tempo espiralar em um espaço sem fronteiras, sem desconsiderar os desafios de enfrentar um sistema que se apresenta, e resistências de corpos treinados para servir esse mesmo sistema. Na 35 Bienal o presente, o passado e o futuro acontecem simultaneamente, em uma fruição não organizada, não tematizada, não territorial. Os corpos que na exposição habitam tem a oportunidade de seguirem seus rumos de acordo com seus desejos, são livres para criarem seus próprios repertórios, roteiros e histórias. A 35 Bienal movimenta, questiona, provoca esses corpos a dançarem suas próprias experiências conectadas com o meio e com o mundo, as coreografias do impossível.

Serviço:

Coreografias do Impossível - 6 setembro -10 de dezembro, 2023

ter, qua, sex e dom, 10h-19h

(última entrada às 18h30)

quinta e sábado 10h- 21h

(última entrada às 18h30)

entrada gratuita

Av. Pedro Álvares Cabral, s.n., Parque Ibirapuera, Portão 3, Pavilhão Ciccillo Matarazzo, São Paulo, SP, Brasil

A exposição tem classificação livre para todos os públicos. Salas ou obras que possam ser consideradas não recomendadas para crianças ou adolescentes estarão indicadas na sinalização do espaço. É proibida a entrada com animais de estimação.

Contato: (11) 5576 7600

contato@bienal.org.br